Logo Prefeitura de Salvador

Afrodescendentes baianos são exemplo de luta pela reparação

 

O debate sobre as reparações históricas ganhou força e virou bandeira do movimento negro. As cotas para estudantes negros nas universidades e em postos de trabalho são exemplos de ações afirmativas pleiteadas, já que para alguns militantes os negros só têm possibilidade de ascensão a partir da junção entre crescimento econômico e políticas públicas. Para alguns analistas, apenas as políticas de ações afirmativas podem auxiliar na reversão das desigualdades raciais no Brasil.

 

CONCIENCIANEGRA2011

No país, o movimento por reparação, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), sugere o pagamento de US$102 mil por cada afrodescendente, além do reconhecimento da escravidão como crime contra a humanidade. Na Bahia, onde há uma massa grande de descendentes de escravos, a luta é histórica. Mas muitos conseguiram a reparação por si próprios. Ascenderam na política, na educação, no judiciário e nas artes, entre elas a mais expressiva aqui, a música baiana, que foi levada para o mundo.

 

Tonho Matéria – Era a década de 80, momento em que blocos afros se firmavam no cenário carnavalesco baiano e lá estava Tonho Matéria, aparecendo no Bloco Ébano. De lá para cá, passou pelos Amantes do Reggae, Araketu, Olodum e Afreketê, cuja tradução é “deus que abre caminhos para outros deuses”. E não é que abriu mesmo? Tonho Matéria começou sua carreira solo de cantor e compositor e hoje tem passagem até pelo cinema, com participações nos filmes “Herois” e “Ele é o mestre Bimba”, onde além de atuar como o personagem principal, também é narrador.

 

Militante do Movimento Negro da Bahia desde a década de 80, ele acredita numa mudança de vida de jovens carentes e mantém o Projeto Mangangá, com aulas de capoeira e cursos pré-vestibulares, com inserção no mercado de trabalho, no bairro do Pau Miúdo. “Hoje já temos jovens formados em engenharia, administração e publicidade, o que muito me orgulha, de ter dado esta possibilidade de ascensão social para estes jovens promissores nestes doze anos do Mangangá”, assinala o cantor. Hoje o seu programa está em outros seis países: Espanha, Moçambique, Noruega, França, Inglaterra e Estados Unidos. Ele organiza também um encontro internacional de capoeira, onde participam doze países e do Encontro de Capoeira no Recôncavo e Zonas Rurais. 

 

Luislinda Valois – A fama da baiana Luislinda Dias Valois Santos, negra, mulher e pobre, primeira a ascender a um cargo importante no poder judiciário baiano e brasileiro, já ultrapassou as fronteiras do Brasil. Chegada recentemente de Assunção, no Paraguai, a desembargadora, agora já aposentada, foi dar seu testemunho na corte suprema daquele país sobre “Os desafios das mulheres negras”. Suas experiências também estão registradas nos livros “Leia. É bom” e mais três outros em andamento, dois deles já nomeados: “O negro no século XXI” e “Negros pensadores do Brasil”.

 

Ela confessa que espera ainda entrar para a Academia Brasileira de Letras.  Hoje ela tem uma cadeira na Academia de Letras do Paraná, onde viveu por seis anos. Uma luta ainda a ser encampada, após se tornar a primeira mulher negra a assumir o cargo de desembargadora na justiça baiana. “Foi difícil. Tive que contratar um advogado fora da Bahia para fazer valer os meus direitos, já que atendia aos dois critérios; de antiguidade e produtividade. Só consegui pela intervenção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)”, esclarece a juíza.

 

Embaixadora da Paz, título concedido pela ONU, Luislinda Valois está envolvida em outras tantas lutas. Mantém o projeto social Justiça, Escola e Cidadania desde 2002, onde já atendeu 5,4 mil crianças e que tem como intuito fazer com que os jovens tomem conhecimento de seus direitos e se formem cidadãos. As mulheres em cárcere, também outro alvo de sua assistência, assim como as mulheres vítimas de tráfico humano. Enviou um documento e conseguiu com a presidente Dilma as cotas para negros nos concursos públicos, baseada no Art. 39 do Estatuto da Igualdade Racial, a obrigatoriedade de promoção de ações para inclusão do negro.

 

Ailton Ferreira – Membro do Terreiro Oxumaré, no bairro da Federação, e da irmandade da Igreja do Rosário dos Pretos, no Centro Histórico. Este é o sociólogo Ailton Ferreira. “Um baiano”, se define o hoje superintendente de Apoio e Defesa dos Direitos Humanos, vinculada à Secretaria Estadual de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos. Militante do movimento negro baiano e da política desde 1986, ele se orgulha de já ter como resultado, em pouco tempo de gestão, o envio para votação na Assembléia Legislativa do Projeto de Lei 20.435/13, que define políticas para a pessoa idosa .

 

 “Estamos trabalhando junto os 417 municípios baianos para a criação de seus conselhos municipais. Hoje só 70 deles têm este organismo instalado”, lembra Ferreira. Mas as políticas públicas de sua pasta abrangem ainda o combate à discriminação por orientação sexual e violência contra a mulher, povos indígenas, crianças e adolescentes em situação de risco, programa de proteção para eles e suas famílias, enfrentamento ao trabalho infantil e tráfico de pessoas e dos direitos humanos. Quando esteve à frente da Secretaria Municipal da Reparação, criou o Observatório Racial, no Carnaval.

 

 Órfão aos 15 anos e oriundo de comunidade carente, ele não perdeu tempo com lamentações, estudou e se especializou. “Assim nós ampliamos a agenda. Pudemos trazer para esta gestão experiências acadêmicas e administrativas, pois fomos os primeiros na reparação em Salvador”.

 

Célia Sacramento – Entre 12 e 13 anos foi morar no Subúrbio Ferroviário de Salvador. Sua mãe fez parte de um grupo que fundou a Associação Nova Aliança. Nessa associação Célia Sacramento desenvolvia muitos trabalhos para o bairro, muito mutirão. Era uma espécie de líder na escola, onde se reunia com a juventude local pra fazer as coisas do bairro, como ir à praia pra jogar vôlei ou dançar no Black Bahia. Começou a militar na universidade apoiando as questões da Unegro, por exemplo, fundado por Olívia Santana.

 

Célia Sacramento afirma que defende e respeita todas as formas de diversidade, sejam elas sexual, religiosa, cultural e física. Ela defende a gestão pública, com práticas de governança corporativa, pois é contadora e advogada, e sempre falou do foco no controle e na transparência. “As pessoas têm que saber no que estão investindo. Têm que saber onde está o dinheiro do tributo. Sou da área técnica, preciso dar essa transparência”, acrescenta. Tem ainda como meta a defesa da educação e uma preocupação grande com o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável para cidade e para o mundo. As propostas foram aceitas e hoje ela é a vice-prefeita de Salvador.

 

Ivete Sacramento – Ex-Reitora da Universidade Estadual da Bahia (Uneb), Mestre em Educação pela Université Du Quebec à Montreal/Canadá, graduada em Letras Vernáculas e licenciatura em português pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), ela é a  ganhadora do prêmio de Direitos Humanos do Ministério da Justiça em 2003. Também é responsável pela inserção da Universidade do Estado da Bahia nas comunidades vizinhas dos Multi-Campi, aproximando-se dos Movimentos Sociais Locais, realizando trabalho conjunto com a Sociedade Civil. Criou o Programa de Formação de Professores – Rede Uneb 2000, hoje com aproximadamente 10 mil professores graduados em 275 municípios da Bahia.

 

Atuou, geralmente, na condição de membro de notório saber, nos Conselhos Estaduais: de Educação, de Desenvolvimento das Comunidades Negras, de Políticas para os Povos Indígenas, dos Direitos Humanos, de Políticas para as Mulheres e Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial e do Iphan. Atuou recentemente como superintendente dos Direitos Humanos da Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Governo do Estado e hoje é secretária Municipal da Reparação da Prefeitura do Salvador.

Skip to content